Na capital paulista, homens são 47% da população e 80% dentro da “Casa do povo”; reportagem é a primeira de série sobre o Poder Legislativo Saiba qual é o papel dos vereadores na democracia e na vida da cidade de São Paulo
O legislativo é, por definição, o mais representativo dentre os três poderes. Nas câmaras, o número de parlamentares é proporcional à população de seus municípios (ou estados, no caso da Câmara Federal). São compostas, como diz a Constituição, por representantes do povo.
Na prática, porém, as câmaras municipais que terão seus vereadores eleitos em novembro passam longe de refletir a população para a qual fazem leis.
Dos 39 municípios que compõem a região metropolitana de São Paulo, 14 não tiveram sequer uma mulher eleita em 2016 para representar seus cidadãos na Câmara Municipal. Cidades como Cotia, Diadema, Itapecerica da Serra e Ferraz de Vasconcelos não têm uma única vereadora entre seus parlamentares, apesar de mais da metade da população nesses municípios ser de mulheres.
Na capital paulista, os 55 vereadores da maior câmara do país deveriam ser um espelho da complexidade e da diversidade de São Paulo. Mas o plenário mostra uma imagem distorcida.
“Quando a gente vê que homens são em torno de 47% da população enquanto que na Câmara são 80%, só na questão de gênero, de sexo, eles não espelham a sociedade que representam”, diz o professor de direito Thiago Amparo, da Fundação Getúlio Vargas.
Divisão entre sexo da população de São Paulo e representatividade na Câmara Municipal
G1
Para Amparo, ter um Legislativo mais plural faria com que as demandas populares fossem mais escutadas. “Existe uma enorme discrepância de gênero e raça nos legislativos tanto municipais quanto estaduais e federais, o que impossibilita ou ao menos dificulta essa representatividade de atender os anseios da população ali representada, especialmente nas populações das cidades que exigem uma aproximação entre o Legislativo e a população.”
Na Câmara de São Paulo, 78% dos vereadores são brancos, e apenas 18% são pretos ou pardos. Entre os paulistanos, 60% se declaram brancos e 37% pretos ou pardos.
Comparação entre a cor declarada da população de SP e vereadores da Câmara Municipal
G1
Para Ana Paula Nascimento, empreendedora e ativista do movimento negro em Cidade Tiradentes, na Zona Leste da capital, o poder político está longe das comunidades. Uma oportunidade de mudança é, para ela, a candidatura de mulheres negras.
“Tendo essa representatividade lá, faz uma diferença muito grande. Porque eu sei que estou falando com uma pessoa com conhecimento de causa, que sabe o que eu estou falando e que não vai tratar o que eu estou colocando para ela como perfumaria, e sim como uma necessidade real que temos aqui”, diz a empreendedora.
Plenário da Câmara Municipal de SP em foto de julho de 2020
Anderson Lira/Framephoto/Estadão Conteúdo
Participação popular
Tão importante quanto a representatividade é a participação popular. Os projetos que a Câmara Municipal discute e podem virar leis têm um caminho longo, que pode levar meses. Os mais importantes precisam ser debatidos em no mínimo três comissões antes de chegar ao plenário, onde serão votados.
Isso foi definido na Constituição Federal, de 1988, com o objetivo de garantir a participação de todos. Se a prefeitura representa a sede do poder, a Câmara é a casa do povo.
Em São Paulo, um exemplo de classe que sabe disso são os motofretistas, que frequentam o prédio da Câmara para discutir o seu espaço na cidade. “Faz um ano e meio que a gente vem aqui como categoria e dois anos como associação”, diz Edgar Francisco da Silva, presidente da Associação dos Motofretistas de São Paulo. “É muito importante a sociedade ser presente, não adianta só votar no político, tem que acompanhar. E não existe outro lugar para exigir a mudança da lei senão o Legislativo.”
São muitas as demandas. Para o engenheiro Gustavo Siciliano, que pleiteia redução nos custos do IPTU, a população deveria ir mais à Câmara. “A sociedade tem que saber que essa aqui é a casa do povo, todo mundo tem que vir, direto. Para obra e para mudar.”
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