Exposição de imagens íntimas sem consentimento lidera ranking de violação de direitos na internet


Organização não-governamental que auxilia o Ministério Público Federal aponta que adolescentes são os que mais buscam ajuda. Segundo o levantamento, as mulheres são as que mais tiveram fotos expostas sem consentimento na rede
Reprodução/RPC
A exposição de imagens íntimas sem consentimento lidera o ranking das principais violações contra direitos digitais, de acordo com a SaferNet Brasil, organização não governamental que atua em parceria com o Ministério Público Federal. Os dados, de 2019, são os mais recentes e mostram que os adolescentes estão entre as principais vítimas que pediram auxílio contra crimes cometidos na internet.
No ano passado, a instituição registrou crescimento de 23% no número de atendimentos, em relação a 2018. Em 14 anos de atuação, já foram contabilizados mais de 4 milhões de denúncias de infrações cometidas na internet.
Ao todo, segundo a SaferNet Brasil, foram 467 denúncias de exposição de imagens íntimas sem consentimento, enviadas por chat e e-mail por usuários de diferentes faixas etárias. Os índices deste ano ainda não foram disponibilizados.
A organização, que reúne especialistas em computação, professores e pesquisadores, recebe denúncias e orienta vítimas de crimes digitais com o objetivo de defender e promover os direitos humanos na internet. Desde 2007, a SaferNet tem mapeado infrações e comportamento social digital, por meio de pedidos de ajuda e denúncias.
Segundo o levantamento, as mulheres são as que mais tiveram fotos expostas sem consentimento na rede. Elas representam 55% das vítimas. Em outros tipos de infração, o público feminino também é o que mais busca a organização para pedir ajuda, como nos casos que envolvem encontros virtuais (86%), ciberstalking (85%), aliciamento sexual infantil online (80%), divulgação de conteúdo de ódio ou violência (69,7%) e ciberbulying (61,5%).
A delegada Juliana Buck Gianini, que atua em Santos, afirma que houve aumento “expressivo” de registros de boletins de ocorrência nos chamados crimes contra honra, como difamação, injúria e calúnia, cometidos nas redes sociais. Apesar de não ter os números, ela destaca que, pelo crime ter sido praticado em ambiente digital, há uma dificuldade maior de identificar o autor, já que ele pode criar diferentes contas e perfis.
Caso a pessoa tenha sofrido alguma violação em ambiente virtual, Juliana recomenda tirar uma captura da tela do dispositivo para garantir prova visual do ocorrido. Em relação aos crimes em redes sociais, é possível realizar a denúncia dentro do próprio aplicativo, ou procurar uma delegacia especializada em crimes cibernéticos. Em Santos, não há órgão específico nesse setor para atendimento ao público. É necessário buscar auxílio nas delegacias comuns.
Problemas com dados pessoais, questões ligadas a fraudes e golpes, e a divulgação de conteúdo com discurso de ódio também estão entre as principais razões pelas quais internautas brasileiros procuram a SaferNet na tentativa de receber orientação e ajuda. O órgão registrou, ainda, no ano passado, denúncias relativas a compras, pornografia infantil e aliciamento sexual infantil, todas ocorridas no meio on-line.
Para o presidente da Comissão de Informática Jurídica, Direito Eletrônico e Educação Digital da OAB/Santos, Mateus Catalani Pirani, é importante não rebater xingamentos ou difamações recebidas na internet, e sim procurar a delegacia mais próxima. Ele destaca que esses crimes podem ser resolvidos por delegacias, já que não são exclusivos do ambiente digital.
O advogado Mateus Catalani acredita que o crescimento das redes sociais exige o aprendizado mais específico das ferramentas
Divulgação/Arquivo Pessoal
Catalani comenta que uma das providências para se evitar transtornos no ambiente digital é investir em mais proteção para os dados pessoais. “Do mesmo modo que procedemos com o plano de saúde, precisamos investir em softwares originais, antivírus, coisas que remetam à segurança da informação”, afirma.
O especialista acredita que os jovens são os mais atingidos pelos crimes digitais, como resultado do cenário de crescimento mundial das redes sociais. “Automaticamente, criamos um palco para esse tipo de situação, e isso pode ser verificado pelos próprios dados. Eles apontam que a maior incidência de criminalidade digital está relacionada à própria atitude dos jovens”.
As fake news são outro ponto que preocupa, já que elas podem gerar novos casos de crimes digitais. Segundo Catalani, as informações falsas são projetadas para incitar raiva e curiosidade. “Com isso, as pessoas se encorajam e acabam destilando ódio, fazendo apologia e praticando crimes”.
Juliana Gianini alerta também para as práticas de golpes financeiros em ambiente digital, que abrangem desde casos de estelionato até ameaças de divulgação de fotos íntimas, a chamada “sextorção”. Ela afirma que, com a realização constante de pagamentos por celulares, há uma demanda “muito mais oportunista do que se imagina”.
Educação midiática
Para a advogada e pesquisadora Tatiana Stroppa, só há um caminho para reverter esse cenário, o da educação midiática. Ela destaca que o tema abrange desde a criação de e-mail e senha até a compreensão de como funcionam as plataformas e mecanismos de busca.
Para a advogada e pesquisadora Tatiana Stroppa, as pessoas foram estimuladas a pensar que na internet não há regras. Para ela, a educação midiática seria a melhor solução
Divulgação/Arquivo Pessoal
Os direitos mais violados no ambiente virtual são de crime contra a honra; autoestima e liberdade de expressão; e calúnia, injúria e difamação. Xingamentos, por exemplo, excedem o direito de crítica. “Não há uma lista do que é extrapolar. Depende do caso concreto”, explica Tatiana. Ela afirma que aos poucos a sociedade entende que determinados comportamentos são inadequados, e podem gerar consequências sérias, como a perda do emprego e processo jurídico.
Mas ainda há muito o que ser aprendido. “Houve o estímulo para a expansão de uma cultura totalmente incorreta, de que no ambiente virtual as regras jurídicas não se aplicam”, comenta a advogada.
Tatiana Stroppa diz que o usuário brasileiro precisa necessário entender o que significa o acesso à internet. Mateus Catalani complementa, explicando que “as pessoas não compreendem que o seu dado virtual é um reflexo dela mesma, e que o mau uso desses dados pode gerar problemas”.

* Sob supervisão de Ivair Vieira Jr, Eduardo Cavalcanti e Lidiane Diniz
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By Midia ABC

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