Mulher que morreu após internação em clínica psiquiátrica mantinha diário: ‘Tive sonhos e não realizei nenhum’


Defensoria de São Paulo entrou com uma representação contra o estado brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Eliana Delaneze morreu aos 41 anos, após ser internada em uma clínica psiquiátrica em Salto de Pirapora (SP). Eliana Delaneze escrevia em diário sobre o que sentia, antes de ser internada em uma clínica de Salto de Pirapora (SP)
Reprodução/ TV TEM
A irmã de Eliana Delaneze, diagnosticada com esquizofrenia e que morreu aos 41 anos, após ser internada em uma clínica de Salto de Pirapora (SP), em 2011, conta que a vítima escrevia em um diário sobre como se sentia. Rosana Delaneze guarda o caderno há 10 anos.
A família de Eliana entrou na Justiça para que a causa da morte seja esclarecida. A Defensoria de São Paulo entrou com uma representação contra o estado brasileiro na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, da Organização dos Estados Americanos (OEA), por suposta omissão na investigação.
Rosana contou à TV TEM que Eliana foi diagnosticada aos 18 anos com esquizofrenia. Ela foi internada três vezes por causa de surtos frequentes. Na última internação, foi para uma clínica privada que era credenciada pelo SUS, mas 11 dias depois precisou ser levada para a Santa Casa.
“Um familiar foi até lá e não encontrou o quadro que a clínica passou para mim. Recebeu a informação de que o pulmão dela tinha sido aspirado e que ela estava entubada e em coma. Isso eu soube não pela clínica, mas por um parente que foi até lá”, afirma Rosana.
Segundo Rosana, Eliana registrava tudo em um diário antes de ser internada. “Era o companheiro dela o caderno, ali ela narrava o cotidiano, narrava a alegria que ela sentia durante o dia, as tristezas, as angústias”, lembra Rosana.
Em um trecho do do diário, Eliana conta sobre os sonhos que não conseguiu realizar e como isso lhe causava dor.
“Vivemos num mundo maravilhoso. Tenho orgulho de todos da minha família, menos de mim, pois tive sonhos e não realizei nenhum, sonho de ser mãe, ser médica, ser motorista, ter uma amiga para desabafar quando estou no fundo do poço.”
Escritos foram guardados pela irmã Rosana, durante dez anos, em Salto de Pirapora (SP)
Reprodução/ TV TEM
Caso na Justiça
Um ano depois da morte de Eliana, a família entrou na Justiça para encontrar explicações sobre o que aconteceu. O caso foi parar na Defensoria Pública do estado de São Paulo, que foi ao órgão internacional.
Segundo a defensora pública Fernanda Balera, o estado não foi responsabilizado nas instâncias penal e civil.
“Não houve esse reconhecimento de que o estado havia sido responsável pelo falecimento dela dentro dessa clínica. Então, a gente decidiu procurar as instâncias internacionais, porque a gente entende que houve uma grave violação de direitos humanos”, afirma.
Defensoria vai a órgão internacional contra estado após mulher morrer em clínica
A família alega que Eliana foi torturada na clínica e Rosana relata tê-la encontrado com marcas de agressões aparentes após uma visita.
“Um dia levaram ela no pátio totalmente dopada. Eu nunca tinha visto minha irmã e nas outras internações desta forma. Ela tinha sangue na boca, na língua, no canto da boca, tinha marcas roxas nos braços”, conta Rosana.
A comissão irá analisar o caso e definir se será julgado pela Corte Internacional ou não. O Ministério das Relações Exteriores será acionado, ele deve pedir informações ao governo de São Paulo, que pede à prefeitura e a Advocacia-Geral da União e, por fim, remete a resposta à Organização dos Estados Americanos.
Entre os pedidos feitos pela Defensoria Pública estão o pagamento pelo estado de danos materiais e morais à família, assim como a prestação de assistência psicológica, médica e social. Além disso, o órgão pede que o estado tome providências para garantir que isso não se repita, como extinguir estabelecimentos psiquiátricos com características similares.
De acordo com a petição apresentada pelo Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos da Defensoria, o “estado brasileiro não empreendeu investigações satisfatórias e nem reparações adequadas a tais fatos”.
“Eu espero que minha voz seja ouvida de todas as formas, por todas as famílias, pelos órgãos competentes, pelas famílias que tem doentes esquizofrênicos para que estejam alerta e para que nenhuma pessoa passe pela tortura e morte que minha irmã passou”, afirma Rosana.
Procurada, a clínica informou, por meio de seu advogado, que não ia comentar o caso.
Sessão de 2020 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos
Reprodução
Veja mais notícias da região em G1 Sorocaba e Jundiaí

By Midia ABC

Veja Também!