Após recuo de Doria, Alesp aprova texto-base do ajuste fiscal


Mudança do texto retirou 4 estatais que seriam extintas e mudanças no ITCMD, levando deputados a aprovarem lei que permite extinção de 6 órgãos, corte de 5.600 cargos e aumento de impostos. Governo não consegue votar projeto que prevê ajuste fiscal
Reprodução/Alesp
A Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou no início da madrugada desta quarta-feira (14), após mais de 2 semanas de embates entre governo e oposição e o recuo da gestão de João Doria (PSDB), o texto-base do pacote de ajuste fiscal para 2021. O texto substitutivo do relator especial designado, Alex de Madureira (PSD), teve 48 votos a favor e 37 contra.
Os parlamentares, porém, ainda deverão votar os destaques, que são trechos que podem ser retirados da proposta original. A sessão foi encerrada por volta de 0h40 e a próxima sessão extraordinária ainda não tem data para ocorrer.
O governo alega que o ajuste fiscal, que majora impostos e extingue órgãos públicos, autorizando a demissão de 5.600 servidores, é necessário para conter um rombo de R$ 10,4 bilhões no orçamento de 2021.
Para conseguir aprovar o ajuste e conquistar votos, a gestão tucana recuou em pontos polêmicos do texto, através de um substitutivo apresentado pelo líder do governo na Alesp, Carlão Pignatari (PSDB). Foi retirada do texto, por exemplo, a proposta de extinção de 4 empresas públicas, pontos que levavam ao aumento do Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCMD). Outras como a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) e a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU) continuam com a previsão de serem extintas pelo projeto.
Foi retirado do texto também a obrigação de retirar a sobra orçamentária, das universidades estaduais e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) de 2019, que seriam destinadas à conta única do Tesouro, e agora continuarão com as entidades.
Alvo de críticas de professores e da comunidade científica, esta parte da proposta já havia sido alterada, já que antes previa retirar este caixa também a partir de 2020 e tinha se restringido a 2019.
Veja as mudanças feitas no ajuste fiscal pelo governo para conseguir a aprovação:
Empresas: retirada, do projeto, de 4 das 10 empresas e órgãos que seriam extintos e que, agora, não serão mais: Fundação Oncocentro (Fosp), Fundação para o Remédio Popular (Furp), Instituto de Medicina Social e de Criminologia de São Paulo (Imesc) e Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp).
Veja a lista de empresas com extinção prevista pelo projeto, entre elas a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU) e a Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo (EMTU).
Imposto de Transmissão de Causa Mortis e Doação (ITCMD): a) retira a proibição do pagamento parcelado em até 12 meses e; b) retirada da obrigação de pagamento adicional do imposto em caso de doação com reserva de usufruto (quando o bem é doado mas o doador permanece morando ou usando o bem até morrer).
Fundo da PM e do Corpo de Bombeiros: retirada do texto a proposta do governo usar o dinheiro destes órgãos, que também seria destinada à conta única do Tesouro.
Fundos de universidades e da Fapesp: Retirada total do artigo que previa a destinação de superávits dos fundos de pesquisa e das universidades de 2019 e anos seguintes para o orçamento de 2021. A proposta era descontar o valor desses superávits do repasse anual obrigatório de 2021 que o governo fará a esses órgãos com base na arrecadação do ICMS.
Trâmite com alterações
Após duas tentativas, em vão, de levar o texto a discussão na Comissão de Constituição e Justiça e Redação (CCJR), da Alesp, que não conseguiu analisar o texto por falta de quórum, o presidente da Casa, Cauê Macris (PSDB), que, no início da análise, há três meses, não facilitou a tramitação, aproveitou uma brecha no regimento interno e levou o texto direto à plenário para votação.
Foram realizadas, nas três últimas semanas, sessões extraordinárias para tentar votar o projeto, mas nenhuma delas teve o quórum mínimo de 48 deputados para iniciar a votação. A falta de consenso sobre a proposta e ataques de que o texto era inconstitucional e aumentava impostos levou à formação de uma aliança inédita entre legendas antagônicas, como PT, PSL, PSOL e Novo, contra o projeto do governo tucano.
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Divulgação/Alesp
Tramitação
O texto do projeto de lei 529/2020 foi enviado pelo governador, João Dória (PSDB), em 12 de agosto e devia ter sido aprovado até 30 de setembro para integrar a lei orçamentária enviada à Casa naquele dia pelo governo, e que prevê o que vai ser arrecadado e no que será possível gastar no próximo ano.
O projeto entrou em debate na semana passada no plenário da Alesp em regime de urgência, após não conseguir ser analisado nas comissões, por falta de quórum.
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Veja abaixo quatro pontos que contribuíram para a derrota temporária do governo na tramitação do projeto na Alesp:
1. Reação das universidades
O texto original do texto previa o corte do superávits financeiros de fundações estaduais, incluindo a Fundação Estadual de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e de universidades, como a USP, da Unicamp e Unesp, e o envio do dinheiro para o Tesouro. Houve críticas da comunidade científica, que argumentaram ser a lei um ataque à autonomia financeira das entidades e que iria paralisar até pesquisas em andamento sobre a Covid-19.
Após essa reação, o governo desistiu em parte da ideia e o líder tucano na Casa, deputado Carlão Pignatari, propôs limitar a transferência dos superávits ao orçamento de 2019.
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2. Falta de articulação política
Mesmo o governo João Doria tendo maioria na Alesp, a exemplo das administrações anteriores do Palácio dos Bandeirantes, a nomeação de um relator para o projeto de lei de ajuste fiscal levou mais tempo do que o previsto: 35 dias. O nome escolhido pelo presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR), Mauro Bragato (PSDB), foi Carlão Pignatari (PSDB), líder do governo.
Eles tentaram por duas vezes colocar em discussão o texto na CCJR, mas não foi possível por falta de quórum.
Deputados da base governista demonstram preocupação com a lentidão da tramitação do projeto, que o Palácio dos Bandeirantes contava que seria aprovado até 30 de setembro. Dada a falta de quórum na comissão, Macris nomeou o deputado Alex de Madureira (PSD), da base do governo, relator especial do projeto de lei, para levá-lo ao plenário diretamente.
3. Disputa eleitoral
As eleições municipais deste ano também contribuíram para o projeto não deslanchar. “Não dá para descartar o processo eleitoral como um fio condutor disso. Além do governo insistir com essa pauta em um momento como esse”, diz Paulo Fiorilo (PT), integrante da Comissão de Finanças, Orçamento e Planejamento da Alesp.
Votar a favor de um projeto que extingue estatais e propõe um plano de demissão voluntária no governo do estado é visto por alguns parlamentares como algo que pode fazê-los perder votos nesta eleição. Dez deputados estaduais disputarão diferentes prefeituras, sendo dois deles na capital paulista.
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4. Os pontos que uniram os diferentes
Reunir em um mesmo projeto de lei medidas de naturezas tão diferentes, como aumento de impostos e extinção de estatais, e com variados impactos orçamentários, uniu bancadas que não costumam votar de forma alinhada.
Deputados do Novo atacaram, durante essa semana, a redução de benefícios fiscais, entendida como uma alta da carga tributária. Para os petistas, a extinção das estatais, como a CDHU, por criar unidades de moradia para a população de baixa renda, foi um fator que contou na obstrução.
Já a ala bolsonarista do PSL integra a oposição mais radical a João Doria dentro da Alesp: um grupo ativo nas redes sociais, que já propôs vários pedidos de impeachment contra o governador.
Na votação desta semana, dos 14 deputados do PSL, 11 obstruíram a votação; todos os dez parlamentares do PT se utilizaram da mesma manobra.
Na oposição, a estratégia seguirá sendo obstruir. Esses parlamentares comparam a hipótese de o projeto ser definitivamente barrado com a vitória, em 2005, do então deputado Rodrigo Garcia, à época no PFL, para a presidência da Casa, contra Edson Aparecido, do PSDB, por 48 a 46 votos. Garcia é hoje vice-governador e principal articulador político de Doria para a aprovação do texto.
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By Midia ABC

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